Em Ações Penais referentes a quatro unidades do Ceuma – Associação de ensino superior em São Luís, localizadas no Renascença, Centro, Bequimão e Anil, o Ministério Público do Maranhão, por meio da 26ª Promotoria de Justiça da Ordem Tributária e Econômica de São Luís, ofereceu denúncia, em 7 de junho, contra os sócios e administradores do referido estabelecimento educacional por sonegação de Imposto Sobre Serviços (ISS) ao Município de São Luís.
O montante sonegado nas quatro unidades soma R$ 159.482.135,97. O ISS tem uma alíquota de 5% do valor do serviço, o que indica um faturamento em torno de R$ 3,18 bilhões. O promotor de justiça José Osmar Alves, subscritor das ações, informou que deixou de fora das denúncias vários autos de infração, porque os crimes estavam prescritos em relação a eles, o que indica que os valores sonegados são ainda maiores.
Nas quatro ações, foram denunciados Clóvis Antônio Chaves Fecury, Ana Lúcia Chaves Fecury, Bernardino Rodrigues Ribeiro e Mauro de Alencar Fecury. O Ceuma dedica-se à prestação de serviços de educação, com cursos de graduação e pós-graduação.
Em todas as denúncias o Ministério Público pede a condenação dos réus pelo crime de sonegação de ISS mediante a omissão de informações às autoridades fazendárias e pela prestação dos serviços de educação sem a emissão de nota fiscal. Essas condutas se acham tipificadas no art. 1º, incisos I e V da Lei 8.137/90, com a agravante descrita no art. 12, I da mesma Lei 8.137/90 (por se tratar de crimes que causaram graves danos à sociedade ludovicense), acrescidas da exasperação decorrente da continuidade delitiva, prevista no art. 71 do Código Penal, por terem os réus sonegado o imposto de forma continuada nos últimos quinze anos.
A pena máxima prevista para o crime é de cinco anos de reclusão, e 360 dias-multa. Se forem condenados nos quatro processos, eles podem pegar até 20 anos de cadeia e pagar R$ 1.980.000,00 de multa cada um.
SONEGAÇÃO
Na ação referente à unidade Bequimão, a Promotoria constatou a sonegação do valor de R$ 3.017.396,00, entre os meses de janeiro a dezembro de 2017, período repetido em 2018, totalizando 24 crimes contra a ordem tributária.
Na manifestação sobre a unidade Renascença, foi atestada a sonegação da quantia de R$ 150.141.210,00, durante os meses de janeiro a dezembro de 2008, período repetido até o ano de 2016, num total de 108 crimes da mesma espécie.
Em relação à Ação Penal cujo objeto é a unidade do bairro do Anil, foi verificado que os denunciados sonegaram ISS ao Município de São Luís na importância de R$ 3.320.073,00, nos meses de janeiro a dezembro de 2017, continuado no mesmo período de 2018, completando 24 crimes da mesma natureza contra a ordem tributária.
Na manifestação referente ao estabelecimento da unidade Centro, o Ministério Público averiguou a sonegação de ISS no valor de R$ 3.003.456,97, nos meses de dezembro de 2014, janeiro a dezembro de 2015 e janeiro a dezembro de 2016, num total de 25 crimes da mesma categoria.
ESTATUTO
Durante a investigação, um dos auditores-fiscais responsáveis pelos levantamentos informou que até por volta do ano de 2004 o CEUMA recolhia normalmente o ISS. Porém, a partir daquele ano deixou de recolher o imposto, recusando-se, inclusive, a emitir nota fiscal dos serviços que presta, usando o argumento de que se tornara uma entidade sem fins lucrativos e, portanto, coberta por imunidade tributária.
A afirmação do auditor foi confirmada pelo acusado Bernardino Rodrigues Ribeiro, que, em depoimento perante autoridade policial, disse que no ano de 2005 foi feita uma alteração estatutária por meio da qual a matriz do Ceuma passou a ser a mantenedora das outras filiais do grupo e, nessa condição, assumiu as obrigações tributárias destas, desobrigando-as do dever de recolher o ISS respectivo. No depoimento, ele acrescentou que, como a matriz passou a se considerar beneficiária de imunidade tributária, todas as demais unidades do grupo deixaram de recolher o imposto.
De acordo com o promotor de justiça, objetivando “legalizar” unilateralmente a imunidade que teriam se fossem considerados entidade de ensino sem fins lucrativos, os denunciados modificaram a personalidade jurídica do Ceuma, que até 2004 se chamava Uniceuma – Centro de Ensino Universitário do Maranhão LTDA, e era responsável tanto pela prestação dos serviços quanto pela respectiva movimentação financeira.
Em 2005, o estabelecimento passou a denominar-se Associação de Ensino, designada como instituição mantenedora, responsável por prover os recursos financeiros necessários ao funcionamento das demais empresas do grupo, que assim passaram a ser ‘mantidas’ pela Associação. Sendo assim, toda a arrecadação financeira passou a ser feita pela ‘mantenedora’.
“A recusa dos acusados em recolherem o ISS coincide com a mudança da sede da matriz do Ceuma, do bairro Renascença, em São Luís, para o bairro Jardim Paulista, na cidade de São Paulo, conforme Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica. Em resumo, da decisão ilegal que os réus tomaram de, unilateralmente, transformarem uma empresa, que todos os maranhenses sabem que é essencialmente comercial, numa entidade ‘sem fins lucrativos’ resultou, até agora, na sonegação de mais de duzentos e cinquenta milhões de reais em ISS ao Município de São Luís, os quais, acrescidos de juros e multas, ultrapassam a quantia de quatrocentos milhões de reais”, ressaltou o promotor de justiça nas ações.
ENVOLVIMENTO
Conforme os documentos e depoimentos do inquérito, os denunciados Clóvis Antônio Chaves Fecury, Ana Lúcia Chaves Fecury e Mauro de Alencar Fecury são sócios e administradores do Ceuma, matriz e filiais, com poder de gerência dos negócios da firma, condição reconhecida por eles em seus depoimentos prestados durante a investigação.
Já o acusado Bernardino Rodrigues Ribeiro trabalha na empresa desde 1997, como professor, e a partir de 1999, como chefe do departamento de contabilidade, tendo assumido toda a parte contábil e fiscal em 2002.
Conforme os autos, Bernardino Ribeiro exerce suas atividades dentro da própria empresa, atuando como um dos diretores do grupo, com poder de decisão, inclusive representando a firma.
IRREGULARIDADES
Para praticarem a sonegação, os denunciados, segundo o promotor de justiça José Osmar Alves, se utilizaram da estratégia de dizer que a empresa é uma entidade sem fins lucrativos, o que lhe daria imunidade tributária. Em razão disso, não emitem nota fiscal da maioria dos serviços que prestam, sonegando o ISS.
“Não há, porém, qualquer respaldo jurídico para os denunciados sustentarem a referida imunidade, posto que esta é uma condição objetiva, que precisa ser oficialmente reconhecida pelo ente tributante, o que nunca ocorreu no caso do Ceuma, sendo certo que os denunciados têm perfeita ciência de que as atividades que desenvolvem se revestem do mais puro espírito capitalista”, pontua o membro do Ministério Público.
Na ação, foram destacados os enormes lucros obtidos pela empresa, o que se reflete no patrimônio individual dos envolvidos. Somente o denunciado Clóvis Antônio Fecury declarou possuir um patrimônio líquido de R$ 65 milhões em 2018, conforme declaração feita por ele à Justiça Eleitoral. Em depoimento no curso da investigação, Clóvis Fecury disse que a empresa não emite nota fiscal e, consequentemente, não recolhe o ISS, porque os sócios entendem que o Ceuma tem direito ao benefício da imunidade fiscal.
A Promotoria enfatiza que, mesmo que a empresa fosse beneficiária de imunidade, as notas fiscais de todos os serviços precisariam sem emitidas, sendo que nesse caso bastaria informar a condição de imune nos documentos.
“Porém, os acusados não emitem as notas fiscais porque sabem perfeitamente que a empresa não é uma entidade sem fins lucrativos, e a prova definitiva de que esta é a verdade é o fato de que, sempre que um aluno exige, os denunciados emitem as notas, e não só as emitem, como destacam e recolhem o respectivo ISS”, frisou.