Ex-funcionário juntou documentos comprovando suposta lavagem de dinheiro com uso de um posto de combustível ligado ao prefeito e denunciou o caso à Seic
SÃO LUÍS-MA: Sete anos antes de vir à tona denúncias de cobrança de propina para liberar pagamentos de fornecedores e direcionamento em processos licitatórios para empresas “parceiras” na Prefeitura de São Luís, o prefeito Edivaldo de Holanda Júnior (PDT) chegou a ser alertado de que seu governo era palco de um escândalo de corrupção. A informação foi revelada pelo então “chefe do setor de transporte”, Almilcar Plese, em março de 2013, conforme documentos obtidos pelo titular do blog.
O dossiê reúne provas de lavagem de dinheiro logo no terceiro mês de gestão do atual chefe do executivo, que oito meses antes – em outubro de 2012 –, havia sido eleito usando discurso de combate à corrupção.
No material produzido naquele ano pelo ex-funcionário, o departamento mais visível da Prefeitura de São Luís, a Blitz Urbana, um apêndice da Secretaria Municipal de Urbanismo e Habitação (SAMURH), responsável pelas operações de impacto em favor da ordem pública, havia se transformado internamente num poço de ilegalidades e de sangria do dinheiro público. Nesse período, a pasta era comandada por Antônio Araújo, atual secretário Da Semosp – Secretaria Municipal de Obras e Serviços Públicos.
Segundo o ex-chefe do setor de transporte, um total de 36 viaturas para um contingente de engenheiros e fiscais que não chegavam a 15, o gasto com óleo diesel nos três primeiros meses do novo governo era equivalente a deslocamentos que cobririam 6 voltas completas ao redor da Terra. O posto fornecedor, conforme relatou, era de longas datas ligado ao prefeito Edvaldo Júnior.
A Blitz Urbana, como o próprio nome diz, serve apenas para ações que se restringem à área urbana de São Luís, mas apesar de tantos carros, alguns deles chegavam a ser abastecidos mais de uma vez por dia na capacidade máxima do tanque. Mais grave ainda, de acordo com o delator, era que existiam pelo menos dois carros que não rodavam e mesmo assim eram “abastecidos” – ou pelo menos geravam notas de abastecimentos que aumentavam a conta da prefeitura com o posto que sempre manteve relação antiga com o chefe do executivo.
As denúncias afirmam que não existia um procedimento padrão para se autorizar os abastecimentos. As notas levavam de dois a três carimbos com as respectivas assinaturas: uma de Almilcar Plese, “chefe do setor de transporte”, cargo para o qual nunca foi nomeado; de Arthur Vitório Bringel Guimarães, ex-diretor da Blitz e ex-secretário Adjunto de Fiscalização, e de Ítalo de Sousa Lustosa, então chefe de gabinete da SAMURH.
Amilcar, que ganhou o carimbo, mas que estava ali só de figuração, começou a questionar o modelo de distribuição de combustível e acabou afastado. Uma semana após ser desligado da função, ele foi à SEIC – Superintendência Estadual de Investigações Criminais, fez a denúncia, forneceu cópias de centenas de notas de abastecimento e se prontificou a colaborar com as investigações.
O posto que atendia a Blitz Urbana era o Cadilhe Brandão & Cia LTDA, que tinha uma estrutura mínima, toda ela instalada no meio da rua, no canteiro da via que passa entre a antiga sede do Serviços de Obras Gráficas do Estado (SIOGE), e os fundos do Mercado Municipal de São Luís. O empreendimento tinha quatro bombas antigas, com aspecto de decadência e sem nenhum abrigo até mesmo para os frentistas.
As notas de abastecimento, apesar de carregadas de carimbos e assinaturas, tinham modelos que só coincidem no nome de fantasia do posto. As duas divergiam no endereço descrito, no CNPJ e na Inscrição Estadual, levantando ainda mais as suspeitas do esquema.
No período das denúncias, uma consulta chegou a ser feita ao portal da Receita Federal ondo foi constatado que o CNPJ de um dos modelos era “inexistente”. No outro modelo, onde está o CNPJ correto do Posto Cadilhe, faltava o número de série. Nenhuma das notas servia como documento fiscal, deixando crer que só eram geradoras de débito.
As notas só registravam a quantidade de combustível, quase todas de 60 litros, como se os tanques das S-10 que formam a frota da Blitiz Urbana sempre se esgotassem ao mesmo tempo. Nelas não se registram o preço do combustível e nem a quilometragem do carro abastecido, impossibilitando todo e qualquer controle de consumo.
Na época, a “farra de combustível” na gestão Edivaldo Júnior chegou a ganhar destaque na imprensa com repercussão no jornal O Estado do Maranhão, edição de 15 de agosto daquele ano. Curioso foi que nesse mesmo ano, o prefeito já acusava o antecessor por causa de supostos débitos que tanto alegou para justificar a fata de ações nos dois primeiros anos do governo.
Entretanto, os mesmos débitos não impediram, por exemplo, que uma caminhonete com placas NNC 1916, fora de circulação desde o 2012, por estar sem o vidro traseiro e sem a bomba de combustível (canibalizada para tirar do “prego” outro carro), fosse ‘abastecida’ por pelo menos 4 vezes, nos dias 19, 22 e 26 de março e no dia 1º de abril de 2013. Em todos os casos, com exatos 60 litros, ou seja, duzentos e quarenta litros de óleo diesel no tanque de um carro que não saia do lugar, segundo denúncia do ex-funcionário à Seic.
Além da S10, Amilcar delatou que uma Toyota Bandeirantes HOO 9594, praticamente é uma sucata, com diferencial quebrado, também chegou a ser ‘abastecida’ pelo menos duas vezes em 2013. Na foto abaixo, o veículo está até sem a placa da frente.
Ainda na época em que as denúncias chegaram ao conhecimento das autoridades policiais foram apontadas que toda a frota da Blitz Urbana estava com o emplacamento atrasado desde 2012. Isenta da taxa de IPVA, a prefeitura teria que pagar apenas o seguro obrigatório, cerca de R$ 110,00 por ano. Três carros ostentavam multas aplicadas pelos pardais, por avanço de sinal, excesso de velocidade ou desrespeito à faixa de pedestres.
*LIGAÇÕES PERIGOSAS
Impossível negar a proximidade entre o prefeito Edvaldo Holanda Júnior e o Posto Cadilhe Brandão & Cia LTDA. A relação vem desde a campanha para vereador, em 2008, passou pela de deputado federal, de 2010, pela passagem de Holanda Júnior pela Câmara Federal e se completou na campanha de prefeito, em 2012, conforme extratos dos portais da Justiça Eleitoral e da própria Câmara.
Na campanha de 2008, a prestação de contas de Holandinha registra quatro pagamentos ao Posto Cadilhe, totalizando R$8.123,00(oito mil cento e vinte três reais); na de 2010, cinco pagamentos, num total de R$ 19 mil reais, e na de 2012 um pagamento de R$ 22 mil. A relação foi mais intensa durante o período em que o prefeito de São Luís era deputado federal, quando prestou contas mensais para justificar sua verba de gabinete pelo menos 16 vezes com notas fiscais do Posto Cadilhe, aliviando mais de R$ 54 mil reais.
O curioso é que esses saques da verba de gabinete da Câmara Federal, calçados com notas do posto, envolvido na farra de combustíveis em seu governo, era de um consumo exageradamente grande, até de R$ 4 mil por mês, como se o então deputado possuísse uma frota de uns dez carros a serviço do seu gabinete em São Luís.
A última nota de Holanda Júnior como deputado, emitida pelo Posto Cadilhe, foi de abril de 2012. É que a partir de maio ele tirou licença deixando em seu lugar o então suplente, Weverton Rocha (PDT), hoje, senador da República.
