A Receita Federal vai implementar, no começo do ano que vem, um sistema para classificar os contribuintes – aos moldes do que já ocorre no Estado de São Paulo. Deverão ser criadas três categorias: A, B e C, em ordem decrescente, conforme os riscos que representam aos cofres públicos. Os mais mal avaliados estarão sujeitos a um regime diferenciado de fiscalização e à aplicação prioritária de medidas legais (entre elas, a cassação de benefícios fiscais), enquanto os melhores terão vantagens sobre os demais.
Prioridade – Um contribuinte classificado como A, por exemplo, terá prioridade no atendimento e na análise dos pedidos de restituição. Ele terá a chance ainda, no caso de indícios de inconformidade, de promover a regularização antes de a Receita abrir um processo de fiscalização.
Critérios – Para definir a nota que será aplicada ao contribuinte, a Receita Federal vai levar em conta quatro critérios: pagamento atualizado dos impostos, os valores declarados (se são realmente os devidos), a entrega das declarações e escriturações nas datas corretas e a situação cadastral dos sócios e da empresa (se as informações são compatíveis com as atividades realizadas).
Implementação gradual – A implementação desse sistema de classificação será feita de forma gradual, diz João Paulo Martins da Silva, subsecretário de Arrecadação, Cadastros e Atendimento da Receita. Começa em fevereiro de 2019 com as empresas do Simples Nacional.
Grandes – Depois, em março, os grandes contribuintes também passarão a ser avaliados e, por último, no mês de abril, as demais empresas. Serão, ao todo, cerca de 7,5 milhões de contribuintes.
Avaliação – Nesse primeiro momento, serão levados em conta para a avaliação os anos de 2016, 2017 e 2018. “Estaremos sempre avaliando os últimos três ou quatro anos. O mais recente terá peso maior, que é para incentivar a regularização. Agora, por exemplo, 2018 terá um peso maior, 2017 médio e 2016 menor”, detalha Silva.
Portaria – As informações sobre o programa, que tem o nome de Pró-Conformidade, e o cronograma de implantação desse novo sistema constarão em uma portaria prevista para ser publicada em novembro. Desde a última segunda-feira está aberta uma consulta pública sobre o tema e as propostas podem ser enviadas para o e-mail [email protected] até o dia 28.
Semelhante – O subsecretário da Receita diz que esse sistema de classificação se assemelha ao que já é feito em outros países e está alinhado com a metodologia sugerida pela Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Econômico (OCDE). “Nós vamos passar a valorizar os bons contribuintes. É uma mudança de comportamento dentro da própria Receita e esperamos que incentive uma mudança de comportamento também entre os contribuintes”, acrescenta.
São Paulo – O Estado de São Paulo é o único no país, até agora, com um programa nesse sentido, o “Nos Conformes”. Foi instituído no mês de abril por meio da Lei Complementar nº 1.320. O sistema de classificação de contribuintes está em fase de testes – começou ontem e vai até o dia 28 de fevereiro. Só depois dessa data é que as notas contarão para que os contribuintes mais bem avaliados tenham acesso a benefícios.
Qualificações – Esse sistema, em comparação com o previsto pela Receita Federal, estabelece um número maior de qualificações. Os contribuintes paulistas serão classificados pelas notas A+, B, C, D, E e NC, aquele que não foi classificado. Quanto mais próximos ao A+, melhores avaliados vão estar e terão vantagens em relação aos demais – como o acesso facilitado à renovação de regimes especiais e ao aproveitamento de créditos acumulados.
Tendência mundial – Iniciativas desse tipo, diz o tributarista Carlos Navarro, sócio do Viseu Advogados e professor da FGV, são tendência no mundo todo. Para ele, uma avaliação mais aprofundada ainda dependerá de como esses sistemas serão executados aqui no Brasil, mas entende, nesse primeiro momento, que pode ser bom tanto para o contribuinte – que poderá ter a sua demanda atendida de forma rápida – como para os Fiscos, que ao separar “o joio do trigo” poderão concentrar esforços nos maus contribuintes.
Ganho de eficiência – “Haverá um ganho de eficiência dentro da Receita”, diz. E, acrescenta, também aos contribuintes. Ele tem clientes, por exemplo, que estão há quase cinco anos esperando resposta de pedidos de restituição e essa é justamente uma das situações que pode ser melhorada se o contribuinte cumprir com as suas obrigações fiscais.
Área aduaneira – Navarro chama a atenção que já há no país um sistema parecido. Trata-se de um programa chamado Operador Econômico Autorizado (OEA), voltado para a área aduaneira. As empresas classificadas como confiáveis têm algumas vantagens em relação às demais. Uma delas é a destinação de um fiscal específico para as suas operações. Elas podem por exemplo, acionar diretamente esse fiscal toda vez que tiverem problemas nas importações e exportações. “Funciona muito bem”, afirma o advogado. “Se o Pró-Conformidade for implementado de forma parecida, eu acredito que tem tudo para dar certo”, acrescenta.
Diferença – Luis Augusto Gomes, sócio do Braga Nascimento e Zilio Advogados Associados, diz haver, no entanto, uma diferença importante entre o programa que está sendo instituído pela Receita e o implementado por São Paulo. Na esfera estadual o programa foi criado por lei complementar e, na visão dele, está de acordo com o sistema legislativo. Já na federal, será por ato da própria Receita e isso pode acarretar discussões judiciais.
Princípio – “As relações tributárias são pautadas pelo princípio da isonomia e da legalidade. O Fisco não pode privilegiar um contribuinte em detrimento de outro”, diz. “O programa pode até ser bom, mas deveria haver uma lei estabelecendo as condições gerais. A Receita não poderia, sozinha, impor obrigações.” (Valor Econômico)