São Paulo, 29 de novembro de 2022 — Sem diretrizes educacionais emergenciais, países ricos e pobres, incluindo o Brasil, foram obrigados a promover intervenções curriculares tardias e algumas vezes desorientadas durante a pandemia de Covid-19, situação que prejudicou a trajetória da retomada, dificultando a recomposição das aprendizagens e a redução da evasão escolar.
Esta é uma das conclusões do estudo “Intervenções Curriculares na pandemia: um olhar para quinze territórios”, encomendado pelo Movimento Pela Base, rede não governamental e apartidária que monitora a implementação de qualidade da BNCC e do Novo Ensino Médio. A pesquisa foi realizada pela consultoria de inteligência educacional Vozes da Educação.
O levantamento apurou intervenções curriculares em 15 localidades de 11 países: África do Sul, Argentina, Brasil (município de Sobral-CE e estados de São Paulo e Mato Grosso do Sul), Butão, Canadá (províncias de Ontário, Quebec e New Brunswick), Chile, Equador, Estados Unidos (estado de Massachusetts), Índia, Portugal e Reino Unido (Inglaterra). O levantamento aponta três tipos principais de intervenção (veja quadro abaixo).
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“No Brasil e em outros países, as intervenções curriculares durante a pandemia tornaram-se uma necessidade, especialmente pelo longo período de fechamento das escolas, o que prejudicou o fluxo de aprendizagem”, explica Deborah Kaufmann, coordenadora de Inteligência de Dados do Movimento Pela Base. “Nosso país foi um dos que mantiveram as escolas fechadas por mais tempo e isso impactou nas adaptações necessárias ao currículo escolar.”
Intervenções x planejamento
A pesquisa detectou que houve intervenções curriculares por períodos de tempos pré determinados nas escolas dos 15 territórios analisados. Em 9 territórios, de 6 países, as mudanças foram obrigatórias para as redes de ensino, incluindo o Brasil, em suas 3 localidades (veja quadro abaixo).
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Os países tiveram diferentes tempos de resposta para adaptação ao cenário da pandemia e início do planejamento e aplicação das intervenções: dos 15 territórios selecionados, apenas 5 apresentaram uma proposta de intervenção curricular ainda no primeiro semestre de 2020 – entre eles o estado de SP. Em Sobral (CE) e MS, isso ocorreu neste ano.
O levantamento aponta, ainda, que a intervenção curricular impactou outros eixos da educação básica: 8 territórios ofereceram formação para professores; 4 disponibilizaram material didático atualizado; 11 ofereceram recursos pedagógicos; e 8 adotaram estratégias de comunicação, como circulares, normativas, lives e orientações in loco.
“Construir uma intervenção curricular durante um evento de crise é uma tarefa mais complexa quando não há orientação sobre como realizá-la. Consequências dessa falta de diretriz podem se refletir no atraso da recomposição das aprendizagens e aumentar a evasão escolar, por exemplo”, aponta a pesquisa.
O levantamento cita, ainda, uma pesquisa da Unicef com 122 países, que revelou que cerca de 70% dos países de baixa e média renda fizeram intervenções curriculares durante a pandemia. E que apenas 1 dentre 5 países de alta renda o fizeram. A conclusão relaciona a necessidade de intervenção curricular ao tempo de escolas fechadas.
Desafios e BNCC
Kaufmann explica que as intervenções curriculares realizadas durante a pandemia visaram auxiliar os educadores na definição de quais habilidades e competências deveriam ser priorizadas, mas que a falta de um plano prévio para situações de emergência — como guerras ou desastres naturais — dificultou esse trabalho.
“Uma intervenção curricular precisa contextualizar necessidades, hierarquizar conteúdos, definir prioridades, avaliar a demanda por inclusão de conteúdos e, além de tudo isso, coordenar a comunicação de mudanças, a capacitação de professores e a distribuição de materiais. Na pandemia, foi um desafio para o qual todos precisavam estar melhor preparados”, alerta.
“O aprendizado que tiramos disso é a necessidade de órgãos de educação começarem a criar um planejamento prévio com diretrizes para futuras intervenções em casos de emergência. Um ponto positivo do Brasil nessa discussão é a BNCC (Base Nacional Comum Curricular), que define as aprendizagens essenciais da Educação Básica e com a qual os currículos estão alinhados. Ter o referencial da BNCC traz agilidade e clareza para escolas e redes promoverem intervenções curriculares, de acordo com cada realidade.”
Sobre o Movimento Pela Base
O Movimento Pela Base é uma rede não governamental e apartidária de pessoas e instituições que desde 2013 se dedica a apoiar a construção e implementação de qualidade da BNCC e do Novo Ensino Médio. Sua missão é trabalhar em parceria para garantir os direitos de aprendizagem e desenvolvimento de todas as crianças e jovens brasileiros.