
Por Redação
“Todo mundo, mais cedo ou mais tarde, senta-se para um banquete de consequências.” A frase de Robert Louis Stevenson, que com agudeza filosófica revela as inexoráveis consequências de nossos atos, surge como um espelho perfeito para a recente decisão do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão. O ex-prefeito de Rosário, José Nilton Pinheiro Calvet Filho, ao não ser reeleito, perdeu o foro privilegiado que, até então, o eximia de ser julgado pela Justiça comum. A sentença, que indeferiu o pedido de reconsideração do Ministério Público, faz ecoar uma reflexão profunda sobre o papel do poder e da justiça na vida política e social.
Em um julgamento crucial, o Tribunal manteve a decisão de que, com a cessação do mandato, perde-se a competência do Tribunal de Justiça para processar e julgar o caso, levando-o à primeira instância, como preconiza a jurisprudência vigente. Essa decisão reafirma a distinção entre os cidadãos comuns e aqueles investidos temporariamente de poderes políticos, como prefeitos, governadores e parlamentares, cujos crimes, quando cometidos durante o exercício do cargo, não devem garantir a imunidade judicial por tempo indeterminado.
A decisão baseia-se na interpretação majoritária do Supremo Tribunal Federal (STF), segundo a qual a prerrogativa de foro se extingue com o fim do mandato, salvo situações excepcionais, como aquelas onde se verifique o término da instrução processual ou a publicação de despacho final. No entanto, mesmo com o julgamento de habeas corpus nº 232.627/DF, que sugere a continuidade da prerrogativa de foro para crimes cometidos no cargo, a Suprema Corte ainda não emitiu uma decisão vinculante que alterasse a lógica estabelecida.
A argumentação do Ministério Público, que invocava a tese da continuidade da prerrogativa de foro, apontava para um entendimento inovador que poderia garantir que ex-autoridades fossem julgadas por tribunais superiores, mesmo após o término do mandato, desde que os crimes estivessem relacionados ao exercício da função pública. Porém, o Tribunal de Justiça do Maranhão, ao reafirmar a decisão de remeter o caso à primeira instância, seguiu o entendimento consolidado, fundamentado na interpretação de que a prerrogativa de foro se extingue com a perda do cargo eletivo.
A metáfora do “banquete de consequências” remete à ideia de que a justiça, por mais que tenha demorado a chegar, não falha em sua missão de colocar todos no mesmo nível perante a lei. Mesmo que o poder político ofereça, temporariamente, uma proteção, ele não impede que, no final das contas, todos enfrentem as repercussões de seus atos. O ex-prefeito, ao perder sua imunidade jurídica, agora se vê diante de um tribunal ordinário, onde a análise de sua conduta será tratada com a mesma seriedade e imparcialidade com que qualquer cidadão seria julgado.
Neste contexto, a decisão serve como um lembrete: o poder é efêmero, e suas consequências são implacáveis. A ideia de uma justiça que não se curva ao poder temporal, mas o julga à luz da equidade e da responsabilidade, encontra eco na sentença, que reafirma a primazia da igualdade perante a lei. A passagem de Calvet Filho de um tribunal superior para a Justiça comum é, assim, um reflexo da inexorabilidade das consequências de seus atos, servindo de exemplo para aqueles que, ao longo do tempo, acreditam que o poder é uma fortaleza intransponível.
Como Stevenson nos alertou, o banquete de consequências é inevitável — e todos, mais cedo ou mais tarde, têm de se sentar a ele.