Política

ARTIGO – A política ao sabor das conveniências

7 de março de 2018


Por Abdon Marinho.
FOI um amigo que contou-me a seguinte história:
Quando bem jovem e filho de político na região do Pindaré, por ocasião de tradicional festa que seu pai costumava promover, pediu a ele os sacos usados para embalar as cervejas da festa (naquele tempo a cerveja era embalada assim).
— Meu pai me arranje estes sacos que os venderei e comprarei uns bodes.
Por coincidência, na mesma época ocorria uma exposição de caprinos na região.
O pai assentiu e lá foi meu amigo em busca do comprador. Não demorou muito fechou negócio com quem lhe ofereceu dez cruzeiros. Um pouco adiante encontrou outro cidadão que lhe perguntou dos sacos a quem respondeu que acabara de vendê-los por dez cruzeiros ao que este conjecturou:
–– Uma pena, iria lhe oferecer quinze cruzeiros.
Ele, então, sentenciou: –– Não seja por isso, desfaço o negócio e lhe vendo pelos quinze cruzeiros.
O seu pai, ao tomar conhecimento de tais negociações, não apenas tomou-lhe os sacos e os deu a outro filho, como ainda o admoestou:
–– Se você pretende fazer carreira na política, a primeira das coisas a fazer é honrar sua palavra e seus compromissos.
Segundo este amigo, pior lição não poderia ter recebido do pai e por isso mesmo não a repassou aos seus filhos. Pois, enquanto procurou honrar com sua palavra e compromissos testemunhou todo o tipo de arrivista virar autoridade enquanto dizia sentado o que não sustentava em pé.
Embora discorde da conclusão deste amigo, de que precisamos nos despir do caráter para prosperar e/ou conseguir êxito nas nossas carreiras, forçoso reconhecer que o seu desalento faz algum sentido.
Vejam a atual quadra política do Maranhão.
Nos últimos doze anos (ou mais) o ex-governador e deputado José Reinaldo Tavares devotou-se à causa política daqueles que tinham no combate ao grupo do ex-presidente José Sarney, talvez, a única credencial.
Assim, já em 2006, trouxe alguém de fora da política partidária, sem nenhum voto para chamar de seu, e fê-lo deputado federal, nos pleitos seguintes o apoiou para o cargo de governador.
Agora, este no poder – e pela ausência de uma oposição consistente – surfando na popularidade, esperava, o ex-governador, a consideração de ser escolhido candidato ao Senado e, não só, o empenho para ser eleito senador por este grupo político.
Não foi o que se deu. Humilhado e preterido desde os primeiros dias do governo que colocou no poder, e sabedor que eram remotas as chances de ser escolhido para a segunda vaga (só este fato: colocá-lo “no murro” para disputar a segunda vaga, veja: segunda vaga) na chapa comunista – e se o fosse seria cristianizado –, o ex-governador buscou abrigo numa terceira via ao governo, onde espera contar com o empenho para sua eleição.
Como não acreditavam que o ex-governador tivesse a coragem de incendiar as pontes, só se deram conta da tolice que fizeram quando já era tarde para trazê-lo de volta e agora trabalham com afinco no sentido de inviabilizar sua candidatura.
Inicialmente, tentam passar à opinião pública a ideia de que o ex-governador foi que precipitara em abandonar o grupo, culpando-o pelo fato de não ter sido escolhido como candidato. Implicitamente dizem que o governador, e não o deputado, é que foi traído – o que não é verdade.
Noutra ponta tentam impedir que lhe garantam a legenda para disputa, no caso o DEM, partido que desde o ano passado tem como certa essa candidatura. Para isso, “convenceram” o comando estadual da legenda e, segundo li, ameaçam com a filiação de importantes figuras, inclusive de deputados federais, dentre elas a da deputada Eliziane Gama, do PPS, que, para ser a candidata do time governista, estaria disposta, até, a oferecer um rim ou metade do fígado.
Esse tipo de arranjo dimensiona bem a pobreza da política maranhense. Num único parágrafo temos absurdos político-ideológicos inimagináveis.
Ora, será que alguém acha normal que o Partido Democratas – que ideologicamente estar a 180º graus de distância do ideário comunista –, faça parte da base de apoio do governo do Partido Comunista do Brasil? Já tratei disso aqui explicando minhas razões.
Entretanto, para o comando regional do partido isso é perfeitamente normal. Tal opinião e “normalidade”, aliás, é referendada pelos comunistas que, para ter o apoio da legenda liberal, talvez, abram mão de apoiar – mas só durante o período eleitoral –, as ditaduras da Venezuela, Cuba, Coreia do Norte e o arranjo chinês.
Quando vejo as lideranças estaduais do DEM apoiando o governo comunista e recebendo elogios dos governistas que os tratam como “modernos”, “arrojados”, “inteligentes” e voltados para os interesses do estado, faço um único questionamento: como os estariam tratando se estivessem na oposição? Certamente, como integrantes das mais retrógradas oligarquias maranhense, violentos, ligados às práticas mais nefastas da “velha política”, etc.
A falta de constrangimento na política do estado é tamanha que nem estranhei quando alguém me disse que no arraial governista foi ou estar sendo cogitada essa prova de lealdade da deputada popular-socialista: sua filiação ao DEM. Logo ela que sempre se mostrou mais próxima de outros seguimentos políticos.
O propósito da prova de lealdade: impedir ou neutralizar a anunciada filiação do ex-governador ao partido, e juntos – a deputada e o comando estadual –, colocarem, no mesmo balaio, liberais e comunistas.
Caso este – ou outro arranjo –, no sentido de inviabilizar a candidatura do deputado José Reinaldo seja posto em prática com a anuência e/ou interferência dos Leões, restará claro – e digo isso com tristeza –, que a política que resolveram empreender ignora qualquer limite e respeito para com as pessoas, importando, unicamente, seus próprios interesses.
Embora provas deste estilo político estejam aí para comprovar, sempre duvidamos que ultrapassem determinados limites.
Um destes limites é que trabalhem abertamente contra o ex-governador que os colocou no poder.
Não acredito que cheguem a tanto, mas não duvido.
Um caso dos mais emblemáticos a atestar “certas ousadias” é o do deputado Waldir Maranhão.
Na crise política de 2016, já tendo por certa a abertura do processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, o governador do Maranhão tentou passar, para as forças que a apoiava, a ideia que poderia conseguir os votos necessários para rejeição do processo. Não conseguiu. Mas, aprovado o impedimento da presidente chamou o deputado Waldir Maranhão, vice-presidente da Câmara dos Deputados, já no exercício da presidência por conta do afastamento do deputado Eduardo Cunha, para que anulasse a sessão que aprovou o afastamento da presidente da República.
Segundo o próprio deputado Maranhão, além da tese jurídica – o governador assegurou que não lhe pediria para assinar se ele mesmo, se pudesse, não assinasse –; uma boa talagada de cachaça pura, para comemorar, antecipadamente, o resultado da empreitada; e a promessa de apoio total, amplo e irrestrito, à candidatura do mesmo (deputado Maranhão) ao Senado, o convenceram a “anular” o impeachment e, pelo que vi, estava convencido a anular até a Lei da Gravidade, afinal, quem é mesmo esse tal de Newton?
O resultado da “tese jurídica irrepreensível”, como sabemos, foi o ridículo planetário.
Pois bem, ninguém pagou preço mais alto, politicamente falando, que o deputado Waldir Maranhão, perdeu o partido que comandava havia anos, diversos aliados, espaço na Câmara dos Deputados, respeito de diversos seguimentos da sociedade e teve a vida vasculhada.
Se não recebeu pelo favor qualquer agrado, tenho por certo que ficará no prejuízo. Hoje, ninguém acredita (nem ele mesmo), que a promessa de ser o “candidato do governador” será cumprida. Aliás, nem falam mais neste suposto apoio.
O deputado se tornou o exemplo mais claro do que na política maranhense ficou conhecido como a tática de “trazer para perto para matar de faca”. Tática que sempre foi imputada ao grupo do ex-presidente Sarney.
Conforme vão se colocando as pedras no tabuleiro político, mesmo o apoio do governador aos ex-presidentes Lula e Dilma, merece certa reserva. Segundo dizem, o real motivo para as declarações de apoios e afrontas ao Poder Judiciário, Ministério Público e Polícia Federal, não é outro que não seja se “habilitar” como herdeiro no espólio político da esquerda. Para estes, faz tudo milimetricamente calculado para ser credenciado como a “voz da esquerda”, neste e nos embates futuros. Daí, também, por mais exdrúxula que possa parecer, essa aproximação com as lideranças jovens do DEM, não quer fechar certas portas.
Quando analisamos tudo isso, essas rasteiras, falta de consideração, traições diversas, comprovamos o quanto a nossa política fracassou no sentido de se tornar um farol a conduzir a sociedade. Como falar em ética? Decência? Pudor? Consideração?
De minha parte, não acredito em atraso civilizatório maior que a política conduzida mais ao sabor dos interesses próprios que de propósitos honestos e transparentes em prol da sociedade e da democracia. O poder não pode ser um fim em si. E, contrariando aquele velho brocado, entendo que os fins não justificam os meios.
A propósito, como dizia a famosa música do nosso cancioneiro: “mas do que adianta estar no mais alto degrau da fama, com a moral toda enterrada na lama?”.
Abdon Marinho é advogado.

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